domingo, 28 de março de 2010

sexta-feira, 12 de março de 2010

Vistas da Baía

Baía de Mondello e Monte Pelegrino I, II e III

Baía de Mondello e Monte Pelegrino

O Monte Pelegrino

A cidade de Palermo se estende a partir da baía de Mondello, tendo ao fundo o Monte Pelegrino. É a maior cidade da Sicília, e o resultado da passagem de muitos povos e culturas por seu território. Foram muitos os conquistadores e as culturas: fenícios, romanos, normandos, bizantinos, árabes, aragoneses. A mistura cultural está presente na arte e na arquitetura, num feliz entrelaçado de idéias de origens diversas. Restos de monumentos da Magna Grécia, catedrais normandas, uso de decoração mourisca com elementos geométricos ou azulejos, os mosaicos e dourados do período bizantino, um pouco de tudo compõe a face da cidade, determinada anteriormente pela situação geográfica privilegiada e pela invejável beleza natural.
Sabe-se que em 1787 Goethe esteve em Palermo e escreveu sobre a cidade e sobre o Monte Pelegrino, uma colina de 1970m de altura com vista privilegiada da baía e da cidade:


Palermo, 3 de Abril de 1787

“A Itália sem a Sicília não deixa marcas na alma: é aqui que está a chave de tudo”.
...a descrição desta baía incomparável e da sua enorme massa de água. Estende-se do lado nascente, onde montes mais baixos descem até ao mar, passando por muitos rochedos irregulares mas de bom aspecto, cobertos de floresta, até ás casas de pescadores dos arrabaldes, continuando depois pela própria cidade, cujas casas deste lado estão todas voltadas para o porto...

...depois, prolonga-se para poente, passando pelo ancoradouro onde acostam os barcos mais pequenos, até ao porto propriamente dito, no molhe, que acolhe os navios de maior porte. Aí ergue-se o poente, para proteger todas as embarcações , o Monte Pellegrino nas suas belas formas, depois de ter deixado entre si e na terra interior um ameno e fértil vale que se estende até à ponta do mar.»

(Goethe- vol 6 de Obras Escolhidas Relógio D’Água)



O Monte Pelegrino parece, à primeira vista, com suas arestas e cortes, obra de um escultor, feito a golpes de talhadeira.
No entanto, todas as partes irregulares e incompletas se aglutinam, constituindo uma unidade harmoniosa quando avistado de uma certa distância. É constituído de rochas, sobretudo calcáreas. Contam-se 134 grutas de origem marinha, de interesse geológico e pré-histórico. È recoberto de vegetação costeira complexa.
Cobre as rochas infindável número de cactos, que nesta época ( setembro) estão carregados de frutos. ( figos da índia?).Os ciprestes e oliveiras, árvores típicas da Itália, se debruçam, contorcem e sofrem, pelos muito que presenciaram. A estrada que nos conduz ao alto é íngreme, sinuosa e muito perfumada pelos ciprestes. Do alto, avistamos a cidade de Palermo, majestosamente instalada, no contorno da baía, e esparramada mais além, até onde alcança a vista.
Ao fundo , uma cordilheira de montanhas, azuis, arroxeadas, cinza-prata, cores emprestadas do mar e do céu.
Chegamos, lá em cima, a uma caverna, onde se encontraram os despojos de Santa Rosália ( Havia vivido aí como eremita), em 1624, e onde se construiu um altar à santa, padroeira da cidade de Palermo, também conhecida como Santuzza. Atrás de uma vitrina, santa Rosália está toda recoberta de ouro e ornada com jóias em ouro e prata. A soma de ex votos, flores e imagens, faz deste lugar uma estranha combinação de kitsch e devoção, o que também serviria para definir o gosto siciliano.
Nosso passeio se encerra nas barraquinhas do lado de fora, que vendem enorme variedade de badulaques e lembranças, desde imagens religiosas, aventais, cerâmicas “gregas e romanas”, soldados de madeira e cerâmica, bonecos sicilianos, colares, etc.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Kaos- casa de Pirandello


Etna visto à distância


Caderno de Viagem


Relato de Viagem
Sicília- primeira parte


Setembro de 1995


Estamos há quase uma semana na Sicília, esta ilha imensa, um outro país de gente italiana, mas cuja terra ocre e restos históricos me faz pensar na Magna Grécia. O território, separado da Calábria pelo estreito de Messina, foi domínio de inúmeras civilizações: fenícios, gregos, romanos, ostrogodos, árabes, etc. Imagino a seqüência de antigos habitantes, seu legado cultural presente na arte e ruínas da arquitetura grandiosa e magnífica.
Em Siracusa há uma tumba provável de Arquimedes, conhecido matemático e físico, que, um dia, ao tomar banho de banheira, descobriu uma lei física, ("Todo corpo mergulhado num fluido sofre, por parte do fluido, uma força vertical para cima, cuja intensidade é igual ao peso do fluido deslocado pelo corpo.") e, ensandecido, nu, saiu pelas ruas anunciando sua descoberta, gritando “Eureka,” a quem quisesse ouvir.
No enorme teatro grego da cidade já foram apresentadas peças de Ésquilo, Sófocles e Eurídice. Platão também teve importante papel em Siracusa, tendo aí estado aos 40 anos de idade ( 388/7 AC), e depois aos 60 e 68 anos, empenhado em difundir sua filosofia. (“O saber, gnosis ,não é para Platão mera contemplação desligada da vida, mas converte-se em tekhne, arte, e em phronesis, reflexão sobre overdadeiro caminho, a decisão acertada, a meta autêntica,
os bens reais.” W. Jaeger. Paideia).
Quando venho à Europa fico diante da verdade inquestionável de que a cultura humana é a somatória reveladora do pensar e do fazer humanos.
Encantam-me os sicilianos, gente simples, que fala um italiano cantado, a língua entre os dentes, chiando, e, às vezes, absolutamente ininteligível para nós. As pessoas são simpáticas, disponíveis, capazes de nos acompanhar por quilômetros para elucidar uma dúvida quanto ao caminho. Percebo, porém, que são bravos, invocados, e não estão abertos a brincadeiras, é preciso cuidado.
Fizemos hoje um passeio pelo rio Ciane, por entre papiros que cobrem de verdes tufos as margens do rio, e muitas vezes deitam-se sobre as águas O barqueiro falava muito rápido e sussurrando os esses, enquanto olhávamos e tentávamos entender alguma coisa. Era um rapaz de olhos azuis muito claros, e arregalados, um rosto expressivo, com ar quase histriônico. O passeio não foi grande coisa, mas os papiros e o sicilianos estimularam minha imaginação.
Os jornais, ontem, anunciaram a morte da mulher de um mafioso importantíssimo da Sicília: Santapaola Minitti. Como estavam presos o marido e dois filhos seus, acredita-se que foi morta para que não entregasse o que sabia, tentando, assim, salvar a pele da família. Esta é a facção da Catânia, a outra facção é de Palermo. Os mafiosos ainda hoje estão impunes, somam-se os crimes de “silêncio” e vingança.
A Sicília é uma região abençoada por Deus, com tantas belezas naturais, que jamais me cansaria de andar por estas terras, com o mar sempre na vizinhança. Para nós, brasileiros, de país tropical, que conhecemos os verdes em todas as nuanças, comovem os ocres, sépias e dourados que colorem a paisagem estranha, as oliveiras prateadas sob intenso sol, e os ciprestes retorcidos, de verdes muito escuros. O céu não tem nuvens, cobalto ou celeste, é claro, e a luz que se esparrama sobre a terra é deslumbrante, inunda de alegria nossos corações. Finalmente, o mar mediterrâneo em toda a volta, como diria Pirandello, o “mar africano’, ora turquesa, ora azurro.
A maravilhosa culinária siciliana, que as nonas italianas em S. Paulo, vêm perpetuando, incríveis “antipasti”, “melanzane” em todas as receitas, o perfume das ervas deliciosas, as frutas generosas, os “dolci” , tudo acompanhado dos vinhos escuros, densos, aveludados, mortalmente saborosos. ( Corvo, Regalealli, Donna Fugatta).
Penso no filme de Visconti, “Il Gattopardo”, de 1963, de Giuseppe Lampedusa, nascido em Palermo, em Pirandello, escritor e dramaturgo, nascido em Agrigento, a humanidade deve muito aos sicilianos.
Visitamos também Agrigento, na costa sul da Sicilia, e local da antiga cidade grega Akragas., uma das mais importantes da Magna Grécia. É conhecida como a cidade dos templos, pela enorme quantidade de monumentos históricos, gregos e romanos, pelos museus com riquíssima coleção de peças arqueológicas.
Luigi Pirandello nasceu em Agrigento em 1867, e hoje existe um museu em sua casa, conhecida pelo nome de Kaos. Situada num planalto, ocre como a cor do solo, arrebatada pelo vento ciclópico, cercada por um jardim de flores exuberantes, e debruçada sobre o mar Mediterrâneo, “o mar africano”, é um sobrado de dois andares, de grande simplicidade e bom gosto, como imaginaríamos a casa de um grande homem. Ali encontramos a beleza em seus móveis sóbrios, de madeira escura, seus livros, cartas, anotações. Lindo o piso da casa, inteiro em cerâmica azul e branca, fresco, como pede o clima. Mais lindo do que tudo, a vista da janela, virada para o mar e para o céu, para o impressionante cipreste, torturado pelo tempo e pelo vento. Neste local exato, Pirandello pediu que o enterrassem. A voz de seus escritos paira no ar, a casa é cheia de seus pensamentos, sua vida permanece na minuciosa escolha dos objetos que um dia o cercaram.
A visita à casa de Pirandello, sozinha, teria valido a viagem à Sicília.

terça-feira, 2 de março de 2010





CRIAÇÃO



À noite crio e construo
Com a mente e os olhos voltados para as centelhas da escuridão
Formas aladas
Muros vazados
Terras bordadas, cravejadas
Das cores e do brilho fantasma
Que insistem em habitar a minha imaginação


De dia, como uma formiga,
Cumpro, obediente, o meu destino,
Molho os meus papéis com os azuis dos muitos céus
Armo esqueletos com cipós
Amarro e penduro as pedras do meu caminho
Brinco com o barro como menina
E fio os fios do chorão