quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010





Criação e processo de trabalho


No processo do meu trabalho a Natureza tem papel fundamental, quer como objeto de observação, quer como fonte de recursos que constituirão a própria obra.
Não penso ou olho para a Natureza no sentido tradicionalmente romântico ou estetizante (à procura do “ belo”), mas no sentido paradigmático, pois através dela reconheço a própria vida, a estrutura de todas as coisas, a passagem do tempo.
Há tempos venho entendendo a pintura como registro das etapas ou momentos da vida, e que uma vez realizadas, permanecem como trechos da memória significativa. Gosto de pensar no trabalho como os fragmentos de memória, as indicações ou referências que nos acompanham das experiências vividas. Porisso, interessam-me o solo e a passagem do tempo sobre ele: as ondulações formadas pelo vento ou pelo movimento das ondas nas areias da praia, a precariedade dos desenhos assim formados, a permanente mudança. Observo as folhas e os galhos que tombam das árvores, mudam de cor e estrutura e se incorporam à terra dando início a um novo ciclo. No trabalho valorizo especialmente as texturas, escarifico as superfícies dos objetos e pinturas porque acredito nas cicatrizes e marcas deixadas pelo tempo.
Se escolho como tema a montanha, ou o rio, ou a árvore, o que desejo representar é a idéia da montanha, do rio ou da árvore, algo que existe apenas dentro de mim. Por essa razão, não consigo definir uma iconografia de conhecimento comum e não gosto de identificar a pintura ou relacioná-la com temas ou idéias. A pintura é cor, luz, textura e matéria, assim como o trabalho tridimensional é a presença da estrutura e da construção, organização de materiais e execução de uma idéia.
O acaso participa do meu trabalho porque uso recursos naturais e os aproveito à medida em que encontro algo significativo. Embora ao iniciar uma obra eu tenha um projeto norteador, ocorrem situações em que o inesperado modifica a direção ao longo do processo de execução do trabalho
Mais especificamente, venho utilizando ferro de construção, pedaços de madeira, pedras roladas ou brutas nas obras tridimensionais, e mais recentemente tenho também executado trabalhos em cerâmica. Nas pinturas uso o pó de mármore, pigmentos que se inserem dentro da massa e lembram o procedimento do afresco, pois a cor é inserida e não superposta à tela. Trabalho também com o recurso eventual da colagem.



Regina Dutra ( meados de 1990 )

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